Irei
contar-vos algo que vos poderá chocar: fui o primeiro a saber que Elvis
não tinha morrido, tendo confraternizado com ele nos dias difíceis
pós-pseudo-rigor mortis. Tudo começou num belo dia de Setembro de
1977, estava eu a comer uma francesinha no Porto (onde vivia nessa
altura, dando aulas de guitarra ao Rui Veloso), quando fui surpreendido
por um telefonema do Elvis – que eu julgava morto -
a pedir que eu fosse ter com ele a Matosinhos, pois estava com desejos
de sapateira. Mal o reconheci, ao chegar à cervejaria onde combinara
encontrar-me com ele, pois ao deixar de usar a sua famosa peruca,
encontrava-se completamente careca . Ao ver-me, desatou num pranto
compulsivo e afirmou que não aguentara a pressão, tendo encenado a sua
própria morte, pois já não conseguia envergar os trajes medonhos com que
o público costumava vê-lo, não imaginando uma indumentária que
conseguisse desmantelar a imagem criada pela anterior. Outra das razões
por ele focadas para ter feito o que fez, prendia-se com a sua voz que
esmorecia a ouvidos vistos. "O problema, meu caro Ânclios, é que não
vivo sem o palco!", confidenciou-me, aos gritos, enquanto tragava mais
um fino, pousado entre 2 riscos de coca desenhados na mesa onde
competiam, entre si, baratas do tamanho dos olhos vermelhos do cantor.
Pediu-me refúgio em minha casa, para estar longe de tudo e de todos.
Lembro-me que andou perdido, sem saber o que fazer, durante dias... Eu
bem o incentivava, levando-o a provar tripas enfarinhadas, papas de
sarrabulho e as já mencionadas francesinhas - essas, ele provou numa
escapadinha que demos a Paris. Todavia, eu não conseguia fazer com que
ele reencontrasse a alegria de viver. Uma tarde, ao ouvirmos em vinil “A
viúva alegre”, virou-se para mim, ajeitando no ar, em jeito de tique, a
sua poupa inexistente, e perguntou-me: "O que há de novo na música
pop?". Acto contínuo, dei-lhe a conhecer Village People, ao que
decidiu imediatamente contactá-los para actuar com eles, pedindo-lhes
sigilo relativamente à identidade. Porém, manteve-se nos Village People
durante pouco tempo, pois o facto de envergar uma armadura medieval não
lhe dava jeito para executar as coreografias, embora o protegesse dos
“avanços” dos outros membros do grupo. Após diversas incursões em
bandas como Misfits, Kiss, ZZ Top, entre muitas outras que se
maquilhavam ou mascaravam, dedica-se hoje a fazer aparições-relâmpago em
Las Vegas, que preenchem páginas de revistas cor-de-rosa. Pontualmente,
colabora com a banda Gwar.
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